Um elefante pode tocar sua própria face para se reafirmar e se acalmar, um dos muitos gestos que a bióloga Joyce Poole tem observado durante décadas de estudos em campo. (©ElephantVoices) |
Elefantes podem usar uma variedade de movimentos e gestos discretos para se comunicarem uns com os outros, de acordo com pesquisadores que estudam esses grandes mamíferos na natureza há décadas. Para o observador humano comum, uma curvatura da tromba, um passo para trás ou uma dobra na orelha podem não significar muita coisa, mas, para um elefante – e cientistas como Joyce Poole –, esses são sinais que transmitem informações essenciais para outro elefante e para a manada como um todo.
A bióloga e conservacionista Joyce Poole e seu marido, Petter Granli, que dirigem a ElephantVoices, uma organização sem fins lucrativos que fundaram para pesquisar e promover a conservação de elefantes em vários santuários na África, desenvolveram um banco de dados on-line decodificando centenas de gestos e sinais distintos feitos por elefantes. As posturas e movimentos ressaltam a sofisticada comunicação dos elefantes, dizem eles. Poole e Granli também decifraram o significado da comunicação acústica feita por elefantes, interpretando os diferentes roncos, bramidos, gritos, barridos e outros sons peculiares que elefantes fazem junto com posturas como o posicionamento e o abano de suas orelhas.
Poole tem estudado elefantes na África por mais de 37 anos, mas somente começou a desenvolver o banco de dados de gestos on-line na última década. Parte de sua pesquisa e trabalho de conservação foi patrocinado pela National Geographic Society.
“Notei que, quando eu saía para campo com convidados que estavam visitando o Amboseli (Parque Nacional do Amboseli, no Quênia) e estava narrando o comportamento de elefantes, chegava ao ponto de, durante 90% do tempo, conseguir prever o que o elefante estava prestes a fazer”, disse Poole em uma entrevista. “Se eles estavam de pé de um certo jeito, estavam com medo e prestes a recuar, ou (de um outro jeito) estavam bravos e prestes a avançar e ameaçar outro elefante.”
No decorrer de milhares de horas de observações, Poole começou a entender e basicamente traduzir o que elefantes estavam comunicando uns para os outros. Ela foi a primeira a descobrir musth (frenesi sexual) em elefantes africanos, um estado de elevada atividade sexual e agressividade em machos, durante o qual eles exibem comportamentos característicos como os gestos classificados no banco de dados, como ondulação de orelha (ear-wave), ricocheteio-arrastamento de tromba (trunk-bounce-drag), lançamento de cabeça (head-toss), queixo para dentro (chin-in) e o distinto andar do frenesi sexual (musth-walk), uma espécie de caminhar pomposo do elefante.
Enquanto Poole trabalhava no mato, seu marido, com formação na área de comunicação, percebeu imediatamente o valor de aumentar o conhecimento do público sobre o sofisticado comportamento desses animais carismáticos e ficou ansioso para compartilhar o que eles estavam aprendendo. “Petter disse: ‘Vamos espalhar isso e fazer com que fique acessível para as pessoas’”, explicou Poole.
Poole e Granli começaram o processo de caracterizar os gestos e manifestações que eles estavam vendo em seu trabalho de campo. Criaram nove categorias abrangentes para o banco de dados de gestos: atento, agressivo, ambivalente, defensivo, integração social, mãe-cria, sexual, brincadeira e morte (já que elefantes têm um comportamento evidente em torno de companheiros mortos).
“Elefantes podem ser dramáticos e muito expressivos ou incrivelmente sutis e discretos. Depende do que está acontecendo e das dinâmicas do grupo”, disse Poole.
Pandemônio do Acasalamento
Alguns dos comportamentos mais dramáticos são vistos na categoria sexual, em uma manifestação que os pesquisadores chamam de pandemônio do acasalamento.
“A fêmea avança apressadamente depois de acasalar e começa uma manifestação incrível em que abana as orelhas, ronca, ruge e faz o maior escândalo, fazendo com que todos se aproximem – a família toda participa”, disse Poole. “Depois ela vai até o macho e fareja seu pênis e sêmen. Ela até recolhe sêmen do chão com sua tromba e joga nela mesma, roncando e rugindo. Esse é o tipo de coisa estilo ‘dramático’, se bem que, nesse caso, serve para atrair outros machos que estão mais distantes.”
E aí ocorrem os gestos mais sutis, como a postura estática, da categoria atento, que elefantes usam quando detectam uma possível ameaça. Os roncos de elefantes contêm frequências muito baixas, algumas das quais as pessoas não podem ouvir. Elefantes podem detectar os mais poderosos desses sons a milhares de quilômetros de distância, e essas mesmas vibrações se propagam sismicamente pelo chão, por distâncias ainda maiores. Perceber esses sinais pode fazer com que um grupo todo fique estático e os elefantes se mantenham completamente imóveis, explicou Poole.
“Pode ser que alguém fique estático primeiro no fundo do grupo”, disse Poole, “e logo em seguida todos os outros percebem os sons que nós não conseguimos ouvir e as vibrações que nós não conseguimos sentir”. Elefantes já foram observados respondendo a sons como os de outros elefantes, de veículos e de uma debandada de zebras, a mais de um quilômetro e meio de distância, assim como de trovões e terremotos distantes. Reagir de forma apropriada a esses sons é importante para a sobrevivência deles.
Senso de Humor
Pool lembra como elefantes que estavam brincando corriam atrás de seu carro, parecendo tropeçar e cair enquanto enterravam as presas no chão (gesto presa no chão) na frente de seu veículo. “Eu costumava achar que eles realmente caíam, mas não penso mais assim!”, disse Poole. “Eu já vi isso muitas vezes, o suficiente para saber que fingir que estão caindo na frente do carro faz parte da diversão. É um dos comportamentos que me levaram a dizer que elefantes têm uma percepção de si mesmos e senso de humor. Eles sabem que são engraçados.”
A seguir, estão exemplos das nove categorias abrangentes que Joyce Poole e Petter Granli categorizaram para decodificar os gestos dos elefantes.
(Todas as imagens e vídeos têm direitos autorais da ElephantVoices e estão incluídos aqui como cortesia de Joyce Poole e Petter Granli.)
Agressivo (Espalhamento da orelha)
(©ElephantVoices) |
Um elefante jovem no Parque Nacional de Gorongosa, em Moçambique, ameaça o veículo de Poole, de onde ela o observa. Ele espalha as orelhas de uma forma exagerada para intimidá-la. Tipicamente em uma pose agressiva como essa, um elefante segura sua cabeça bem acima dos ombros e, com as presas levantadas, direciona seu olhar para seu adversário. Assim como é visto na manifestação de pé com postura erguida – outro gesto agressivo descrito no banco de dados –, um elefante pode aumentar sua altura ficando em cima de um tronco ou de um formigueiro para assumir uma estatura maior, tática usada por machos quando estão checando o tamanho um do outro.
Assista a um vídeo de elefantes brincando, enquanto Joyce Poole narra e explica seus comportamentos. Esse vídeo inclui alguns gestos de brincadeiras, como enterrar presas no chão, sacudida ou balanço de cabeça, brincadeira social de esfregar.
A relação entre uma mãe e seu filhote é de proteção, reafirmação e conforto. Mães e outros membros da família fazem carinho nos filhotes de várias formas, como enrolar a tromba na perna traseira do filhote, como pode ser visto na foto acima, no Parque Nacional de Amboseli, no Quênia. Mães também enrolam suas trombas em volta da barriga do filhote, em seus ombros e por baixo de seu pescoço, muitas vezes tocando sua boca. Geralmente elas emitem um gentil ronco enquanto fazem esses gestos de carinho.
Elefantes têm um olfato incrível. O jeito como um elefante ergue a ponta de sua tromba pode mostrar a um observador para onde sua atenção está voltada. Quando a tromba está levantada na forma de um “s”, postura chamada de farejo periscópico, o elefante está detectando odores carregados pelo vento. Esse movimento é usado quando eles querem informação adicional, como quando o elefante encontra estranhos ou percebe perigo. Um outro tipo de farejo é o farejo direcionado, em que o elefante segura sua tromba relativamente reta e aponta-a na direção de interesse.
Elefantes avançam em massa na direção do veículo de Poole em uma manobra coordenada de avanço de grupo. A primeira linha de defesa de elefantes é se juntarem, em resposta a uma ameaça que foi percebida, enquanto eles decidem que ação tomar. Na foto acima, uma velha matriarca chamada Provocadora – do grupo de elefantes Mabenzi, no Parque Nacional de Gorongosa, em Moçambique – tinha instigado o avanço de grupo. Depois, ela delegou o “trabalho sujo” para as outras fêmeas, segundo Poole. Tuskless, uma outra elefanta, liderou o ataque, com o suporte de outros 35 elefantes atrás dela.
Quando um macho está em estado de frenesi sexual ou musth (o termo para um estado sexual elevado), como o elefante da direita na foto, e está pronto para acasalar, ele se aproxima de uma fêmea em estro (na esquerda) e começa a empurrá-la ou direcioná-la com sua testa, antes de montá-la. Essa fêmea está mantendo sua posição para indicar que ela está pronta para acasalar. Ela ativamente empurra o macho de volta, travando suas pernas. O acasalamento acontece quando o macho coloca suas pernas dianteiras nas costas da fêmea.
Elefantes são empáticos e consolam, alimentam, ajudam ou tentam levantar um elefante caído ou machucado. Eles também têm um entendimento de morte e parecem prestar respeito aos mortos de sua própria espécie. Elefantes podem usar suas presas e trombas para tentar alimentar um elefante morto, ou tentar levantar ou até mesmo carregar um elefante doente, um elefante que está morrendo ou um elefante morto.
Se um elefante está nervoso ou ambivalente em relação ao que fazer, ele (ou ela) pode iniciar o toque de rosto, tocando a própria face, boca, orelha, tromba, glândulas temporais, aparentemente para se reafirmar e se acalmar.
Quando um membro da família quer ir em uma direção específica, ele fica com uma determinada postura, que Poole e Granli chamam de postura de “vamos embora”. A elefanta que inicia esse movimento ficará de pé na periferia do grupo e levantará ou balançará seu pé (gesto balanço de pé) na direção em que ela quer ir. Ela virará de propósito na direção desejada, enquanto ronca para chamar e dizer aos outros elefantes “eu quero ir nessa direção. Vamos juntos”, repetindo isto mais ou menos a cada minuto. Sua chamada persistente atrai a atenção de outros que podem, aos poucos, se mover para acompanhá-la.
Todos os materiais de vídeo foram filmados na reserva de Maasai Mara, onde a National Geographic’s Northern European Fund está apoiando o projeto da ElephantVoices “Parceiros dos Elefantes: Conservação Através da Ciência de Cidadãos e Tecnologia da Internet” / "Elephant Partners". Neste link, saiba mais sobre o projeto Elephant Partners, em Maasai Mara, e acesse aqui a filmagem da palestra de Poole na National Geographic sobre a iniciativa.
Link para o texto original.
Saiba mais sobre a comunicação dos elefantes acessando os seguintes links:
Tradução, revisão e edição: Ruby Malzoni, João Paiva, Teca Franco, Junia Machado.
Link para o texto original.
Saiba mais sobre a comunicação dos elefantes acessando os seguintes links:
- A Comunicação Acústica dos Elefantes
- A Comunicação Tátil dos Elefantes
- A Comunicação Sísmica dos Elefantes
- A Comunicação Química dos Elefantes
- Elefantes são capazes de aprender comunicação vocal.
Tradução, revisão e edição: Ruby Malzoni, João Paiva, Teca Franco, Junia Machado.